Ai, há quantos anos que eu parti chorando Deste meu saudoso, carinhoso lar!… Foi há vinte?…há trinta? Nem eu sei já quando!… Minha velha ama, que me estás fitando, Canta-me cantigas para eu me lembrar!…
Dei a volta ao mundo, dei a volta à Vida… Só achei enganos, decepções, pesar… Oh! a ingénua alma tão desiludida!… Minha velha ama, com a voz dorida, Canta-me cantigas de me adormentar!…
Trago d’amargura o coração desfeito… Vê que fundas mágoas no embaciado olhar! Nunca eu saíra do meu ninho estreito!… Minha velha ama que me deste o peito, Canta-me cantigas para me embalar!…
Pôs-me Deus outrora no frouxel do ninho Pedrarias d’astros, gemas de luar… Tudo me roubaram, vê, pelo caminho!… Minha velha ama, sou um pobrezinho… Canta-me cantigas de fazer chorar!
Como antigamente, no regaço amado, (Venho morto, morto!…) deixa-me deitar! Ai, o teu menino como está mudado! Minha velha ama, como está mudado! Canta-lhe cantigas de dormir, sonhar!…
Cante-me cantigas, manso, muito manso… Tristes, muito tristes, como à noite o mar… Canta-me cantigas para ver se alcanço Que a minh’alma durma, tenha paz, descanso, Quando a Morte, em breve, ma vier buscar!…
Abílio Manuel Guerra Junqueiro, Portugal, (1850-1923)
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto, que, para ouvi-las, muita vez desperto e abro as janelas, pálido de espanto…
E conversamos toda a noite, enquanto a Via-Láctea, como um pálio aberto, cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: – “Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi. -“Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido capaz de ouvir e de entender estrelas”.
Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, Rio de Janeiro, (1865-1918)
Eu bato, eu bato, eu bato à tua porta, bato sem ver que a porta está aberta. Sem ver-te, sei, tua presença é certa, e tento orar, mas minha voz é torta.
A luz que vem de ti em dois me corta,, e do que fui e sou outro desperta. Não posso, assim, a ti dar-me em oferta, pois já nem sei que ser meu ser comporta.
Tudo o que busco dás, dás de sobejo, pois sabes mais do que eu o que desejo, e estás comigo e em mim, sempre a meu lado.
Comigo estás na paz e nas pelejas. Por tudo o que me dás louvado sejas, por tudo o que não dás sejas louvado.
Ai, há quantos anos que eu parti chorando deste meu saudoso, carinhoso lar!… Foi há vinte?… Há trinta?… Nem eu sei já quando!… Minha velha ama, que me estás fitando, canta-me cantigas para me eu lembrar!…
Dei a volta ao mundo, dei a volta à vida… Só achei enganos, decepções, pesar… Oh, a ingénua alma tão desiludida!… Minha velha ama, com a voz dorida. canta-me cantigas de me adormentar!…
Trago de amargura o coração desfeito… Vê que fundas mágoas no embaciado olhar! Nunca eu saíra do meu ninho estreito!… Minha velha ama, que me deste o peito, canta-me cantigas para me embalar!…
Pôs-me Deus outrora no frouxel do ninho pedrarias de astros, gemas de luar… Tudo me roubaram, vê, pelo caminho!… Minha velha ama, sou um pobrezinho… Canta-me cantigas de fazer chorar!…
Como antigamente, no regaço amado (Venho morto, morto!…), deixa-me deitar! Ai o teu menino como está mudado! Minha velha ama, como está mudado! Canta-lhe cantigas de dormir, sonhar!…
Canta-me cantigas manso, muito manso… tristes, muito tristes, como à noite o mar… Canta-me cantigas para ver se alcanço que a minha alma durma, tenha paz, descanso, quando a morte, em breve, ma vier buscar!
Abílio Manuel Guerra Junqueiro, Portugal, (1850-1923)