JOSÉ RAMOS - ENXUGANDOGELO

Xexéu o imitador

Era uma rua antiga do bairro. Antiga e importante, por que servia de parâmetro para muita gente. Era a melhor referência.

Tipo: fica próximo da Rua Jambeiro!

Era a melhor referência, inclusive para os carteiros dos Correios e demais entregadores de encomendas e correspondências. Nessa rua ficava a casa 38. Casa da Dona Amelinha e Seu Gonzaga, que formavam o casal mais antigo de moradores da rua. E do bairro.

Chegaram ali nos anos 50 e viram crescer e progredir várias gerações da sua árvore genealógica, e das outras famílias. Seu Gonzaga e Dona Amelinha, era o casal proprietário da casa 38.

Quando ali chegaram, Seu Gonzaga e Dona Amelinha, – vieram da Vila Santa Quitéria, de outro bairro distante -, encontraram uma espécie de condomínio fechado (nos dias de hoje) e casas contíguas. A Rua Jambeiro fora bastante arborizada, e claro, entre as árvores uma porção de jambeiros. Daí o nome da rua, que, na verdade, era oficialmente denominada de Rua Presidente Prudente de Moraes. Mas o povo resolveu que seria, definitivamente, Rua Jambeiro.

Mudar para quê?

Pois ali, durante anos, Seu Gonzaga manteve instalada uma campainha afixada na porta frontal da casa, com o objetivo de facilitar o atendimento a quem chegava – devido o tamanho da casa – para alguma visita.

Também durante anos, na alameda central que dividia a Rua Jambeiro em duas, existiu um jambeiro que, sem qualquer explicação, produzia mais frutos que os demais, além de uma floração diferenciada. E, floria mais que o normalmente esperado, formando um tapete róseo no chão. Ficava na frente da casa, dividindo a rua, como se esperasse ser visitada por muita gente.

Aquele tapete róseo na floração, sinalizava sempre uma exagerada quantidade de frutos.

Eis que, inesperadamente, chegou o dia da volta de Seu Gonzaga. Dona Amelinha enviuvara, e, passou a morar só, naquele casarão. Os filhos e netos pouco vinham visita-la. Era uma solidão enorme.

Não demorou muito, o jambeiro secou, envelheceu e quebrou.

Inexplicavelmente, durante anos, e quase todos os dias, sempre por volta das 10 horas, a campainha da casa 38 tocava. Tocava repetida e insistentemente. Dona Amelinha levantava da velha cadeira de balanço, caminhava demoradamente para atender o toque da campainha. Abria a porta e não encontrava ninguém.

E não havia ninguém, mesmo.

No telhado da casa, pousado num velho galho seco do antigo jambeiro, um xexéu cantava todo dia, imitando a campainha que, durante anos ouvira tocar. Aprendeu.

Demorou para Dona Amelinha perceber.

Por anos, achava que Seu Gonzaga chegava para leva-la junto.

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